Tradução: "Entrevista exclusiva: Fujita sobre o final de Wotakoi - Parte II"

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Antes tarde do que mais tarde, finalmente fiz a tradução da Parte II da entrevista que Kodansha fez com a Fujita em 2022. Originalmente, essa entrevista foi publicada em vídeo e também transcrita em duas partes (Parte I e Parte II). Caso ainda não tenha lido a tradução da Parte I, comece por ela! 

Novamente, antes de começar com o texto traduzido, queria primeiro deixar o agradecimento que a Kodansha USA fez para a tradutora Sawa Matsueda Savage e para a editora (da edição inglês) Vanessa Tenazas, que auxiliaram na entrevista; e o aviso de que essa transcrição foi feita a partir do áudio da entrevista com a Fujita, em que sua editora, Suzuki, estava presente. Assim, alguns comentários dela também foram incluídos nas respostas.

Importante lembrar que, apesar de ter um nível avançado de inglês, não tenho experiência com tradução. Tudo que traduzi até agora foi para o blog. Comentários e informações incluídas por mim durante a tradução estarão dentro de [colchetes].

Vamos à entrevista! Assim como a Parte I, ela foi separada em duas partes e as perguntas foram feitas em pequenos blocos, com uma ou duas por tema. 

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Sobre hobbies - Qual seria seu “tipo” como otaku? 

Fujita: Eu gosto de videogames e jogo por diversão jogos como Animal Crossing e Pokemon. O tipo de jogo que eu gosto é aquele que eu posso jogar no meu tempo, que eu sou livre para jogar como quiser, sozinha.

Recentemente eu comecei a jogar TRPGs (tabletop role-playing games). Cthulhu, um desses RPG de mesa, começou a ganhar muita popularidade na última década e virou uma trend fazer streams dos jogos no YouTube. Um dia, eu assisti um desses que foi muito divertido e me deixou curiosa. Joguei com a minha família e foi assim que eu comecei a me interessar mais.

Eu gosto de fazer os personagens e deixar eles irem criando as histórias, e enquanto fazer um mangá dessa forma demanda muito tempo e energia, um jogo de mesa é menos desgastante e muito bom como uma diversão casual. RPGs de mesa são bem únicos nesse sentido, porque eles me deixam criar personagens e manejar eles de forma que não é possível em um mangá

Além dos jogos, eu gosto de coisas de terror. Enquanto eu trabalho, tenho colocado vídeos, para tocar no fundo, de youtubers explorando lugares mal assombrados ou storytellers profissionais contando histórias de terror. Fico muito intrigada com o sentimento "medo", é curioso e impressionante que ficar com medo também pode ser divertido.

Eu acho que essas duas emoções, estar com medo e se divertir, podem envolver um processo similar, apenas com uma roupagem diferente. Uma história bem pensada é assustadora, mas também te faz pensar "Uau. Isso é bem legal". Todos podem sentir medo e o mesmo vale para se divertir. Como eu desenho mangás, eu tenho o hábito de pensar muito sobre o medo que eu sinto para tentar entender o que deu origem a essa emoção. Eu penso nos elementos separadamente até chegar em um motivo que faz sentido para mim, como "talvez seja assustador porque essa parte da história foi contada com esse tom". Quando eu ouço essas histórias, uma parte de mim pensa nisso como uma pesquisa, esperando conseguir replicar esse método no mangá, outra parte só quer aproveitar esse sentimento de medo como qualquer outra pessoa do público. 

Sobre o final de Wotakoi - Quais foram os desafios ao terminar a obra?

Fujita: Eu não estava dividida sobre terminar o mangá. Foi até onde pode ir e eu achei que estava na hora de terminar. Eu sentia que a história não poderia continuar sem ter a Narumi enfrentando seu conflito interno sobre esconder seu lado otaku e se eu esperasse muito para continuar nesse enredo, me preocupava que talvez não ficasse mais claro sobre o que se tratava a história. Durante os seis ou sete anos em que trabalhei no mangá, começou um distanciamento entre os leitores e leitoras e a personagem que eu, originalmente, pretendia que a Narumi fosse. Então estava chegando ao fim o tempo para fazer o fechamento da história da Narumi de querer esconder seu lado otaku, a premissa inicial da história. Closet otaku [Nota: Aqui a Fujita chama de closet otaku aquelas pessoas como a Narumi, que escondem essa parte da sua vida] estão se tornando uma minoria e assim que fosse mais comum pensar que não há razão para esconder essa 'otaquisse', ficaria mais difícil de fazer com que a história se mantivesse convincente para leitoras e leitores. Pensando por esse lado, eu fiz isso bem a tempo de manter a identificação do público com história, então acho que o timming foi bom.

Reflexões - Você conseguiu desenhar o final que queria? 

Fujita: Quando estava terminando o mangá, eu pensei muito sobre os dois últimos capítulos. Eu precisava finalizar o conflito no relacionamento da Narumi com o Hirotaka, mas também precisava  pensar em como isso se encaixava no conflito interno dela e onde o Hirotaka estaria envolvido nessa situação pessoal da Narumi. Fui eu quem criei Wotakoi, mas durante toda a obra, minha editora, Suzuki, me ajudou a fazer os ajustes necessários. Nós duas discutimos o que faria mais sentido para os personagens. Nós tivemos algumas ideias que seriam boas se esse não fosse o final do mangá, mas queríamos algo maior, já que seria uma situação especial. Não tínhamos como ceder em relação à isso. Nós acabamos indo por um caminho totalmente diferente da ideia inicial.

Suzuki: A ideia que a sociedade tem hoje de um otaku mudou muito desde o início da obra. Sendo bem otimista, pode ser que Wotakoi tenha tido uma influência nisso, mostrando que esta tudo bem ser um pouco mais aberto em relação a sua 'otaquisse'. Agora as pessoas estão ficando muito mais abertas em relação a isso do que nós esperávamos.

Fujita: Minha primeira ideia foi voltar para vibe inicial e as brincadeiras nesse final, mas enquanto trabalhava no mangá, as coisas começaram a ficar emocionais, comoventes. Eu não queria aquele final que grita "É o fim!", por isso eu queria terminar numa nota mais cômica... (risos)

Suzuki: Eu achei que manteve o estilo inicial da obra, mesmo com a Narumi conseguindo superar seu problema. Eu acho que terminou mantendo a proposta do mangá. Os personagens conseguiram, cada um, individualmente, ter seu momento de brilhar no último volume, nas histórias exclusivas da edição impressa, e isso de um jeito que te faz sentir vontade de ver mais. Eu gostei muito da parte em que a Kou muda a forma como chama o Naoya.

Fujita: Esses momentos foram pensados como um presentinho para os fãs!

Suzuki: Os capítulos exclusivos da edição física não foram os únicos. Você também não se conteve na hora de desenhar a capa do artbook.

Fujita: Eu desenhei todas as situações românticas que eu me abstive de desenhar antes.

Novidades - O que você gostaria de fazer agora? Está trabalhando em algo novo?

Suzuki: Nós não podemos falar muito sobre isso, mas estamos conversando sobre.

Fujita: Eu estou me preparando para uma próxima etapa.

Suzuki: Eu acho que vai surpreender a todos, de um jeito bom. Espero que as pessoas fiquem contentes.

Mensagem para os fãs de Wotakoi

Fujita: Não tenho como agradecer o suficiente pelo apoio que recebi e espero vê-los novamente, de um jeito ou de outro!

Sobre os personagens - Nos conte porquê você ama cada um deles! 

Narumi Momose

A Narumi era a mais fácil de trabalhar, porque eu não precisava me preocupar muito em como retratar ela. Era ela que funcionava como meio de aliviar a tensão nas situações, fazendo todos sorrirem só por estar ali. A Narumi é a heroína, mas eu queria fazer com que ela fosse o herói que salva o Hirotaka. Bem no finalzinho, eu consegui fazer com que o próprio Hirotaka salvasse seu herói, a Narumi. Eu fico muito feliz de ter conseguido guiar a história até ali.

Hirotaka Nifuji

O Hirotaka é, na verdade, quem seria a heroína. Por isso eu tive muito cuidado ao retratar ele e muitas das vezes que minha editora rejeitava um storyboard, tinha a ver com como eu apresentava ele. Nós tínhamos discussões do tipo: "Se você fizer ele sorrir aqui, pode ser que o sorriso dele fique menos especial." 

Taro Kabakura

Eu fazia o Kabakura pensando que estava tudo bem se ele fosse um pouco babaca. Quando eu tive a ideia para ele, era uma situação em que ele falava algo rude ou egoísta em uma discussão com a Hanako. Eu não me importei de fazer com que ele parecesse ruim ou um babaca, dependendo de como fosse interpretado, mas eu queria me certificar de que ele não parecesse estar completamente errado. Eu queria que as discussões entre Kabakura e Hanako fossem brigas advindas de diferenças de valores entre eles. Eu pedi conselhos para várias pessoas sobre como manter um equilíbrio, de fazer com que o modo de pensar do Kabakura fizesse sentido em certas cenas. Ele foi o segundo mais fácil de trabalhar, ficando atrás da Narumi, então eu gostei de desenhá-lo. Foi um ótimo personagem para colocar em situações mais difíceis.

Hanako Koyanagi 

Ela era uma boa senpai para a Narumi: mais velha, confiável, legal e tinha compostura. Mas com o Kabakura ela age como uma criança e eu queria fazer esse contraste. Algumas pessoas são mais insensíveis com pessoas que elas tem mais intimidade e eu queria mostrar isso no casal KabaHana, fazendo com que vistos de fora eles parecessem aquelas cenas de comédia de picuinhas de marido e esposa. Eu nunca tinha feito uma personagem feminina como a Hanako, então, no inicio, eu não tinha muita certeza se iria gostar dela. Uma coisa em comum dos dois, Kabakura e Hanako, é que eles gostam de aparentar serem legais.

Acho que essa é uma oportunidade para dizer que os personagens que eu escolhi para os cosplays da Hanako são baseados no que eu acho que ela escolheria fazer, então mesmo que as pessoas achem que esses são meus personagens favoritos, não é bem o caso.

Naoya Nifuji

Eu não sabia o que fazer com o Naoya até mais pra frente na obra. Ele era tão inocente que parecia que eu estava desenhando uma criatura mítica que eu nunca tinha visto antes. Quase como um unicórnio, que as pessoas dizem existir, mas ninguém nunca viu um. Os traços de personalidade do Naoya são os que eu menos me identifico. No início, foi bem difícil colocar ele, porque o personagem consistia em ser inocente, alheio as coisas e puro, e isso não é muito pra poder trabalhar. Mas ao introduzir a Kou, eu decidi que queria fazer com que ele desse apoio emocional a ela, em outras palavras, ser a fonte de luz* dela. Foi assim que o papel do Naoya como personagem se materializou. Sem a Kou, ele estaria ali apenas para ter o Hirotaka dizendo que ele é ruim em videogames.

*O kanji de Kou significa luz em japonês.

Kou Sakuragi

Quando eu propus o design da Kou, eu quase tive que refazer tudo, porque "parecia muito um homem". Mas eu insisti, prometendo que ela ficaria mais fofa com o passar do tempo. Eu a achava fofa daquele jeito e não queria ter que mudar para adequá-la a visão de fofura da sociedade. Eu estava decidida a fazer com que parecesse que ela e o Naoya não iam dar certo, então não poderia fazer a Kou "pré-transformação" mais fofa. Eu queria que a Kou fosse uma otaku sem muito amor próprio que é erguida pelo Naoya. O Naoya é radiante ao extremo [Nota: aqui a Fujita se refere a personalidae do Naoya como “Light type”], então mesmo me sentindo mal pela Kou, eu sabia que ela precisava começar dessa forma, lá embaixo. Mas as pessoas com baixa-autoestima como ela geralmente são muito gentis. Se machucam facilmente, por isso são cuidadosos para não machucar os outros, e também são mais observadores. Acho que, de todos os personagens, a Kou é a mais gentil.

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E finalmente saiu o segundo post para o aniversário de 10 anos de Wotakoi, que foi em abril. Foi a parte final da entrevista que eu comecei a traduzir ano passado. Demorou, mas terminei. Agora espero ter tempo para fazer os outros post que pretendo!

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